A realidade social da educação.


Vou contar dois contos reais que mais parecem ficção, são duas histórias reais aos quais como professor em escola pública da periferia acabei vivenciando. Vou contar essa história não para chocar vocês, mas para que possamos analisar que essas situações acontecem no nosso cotidiano, diariamente, mesmo não fazendo parte da nossa família, fazem parte da família das outras pessoas, que podem ser nossos conhecidos mesmo que não saibamos.
1 - Uma linda garota extrovertida abalada.
A alguns anos fui trabalhar com salas de aula dos 1 anos do ensino médio para um debate sobre a legalização do aborto, dividindo a sala em dois grupos, os que eram a favor e os que eram contra, pedi para que cada grupo estudassem as opiniões e os motivos de cada grupo ser de opiniões diferentes, e a partir criar argumentos para ser a favor ou contra.
Em um desses grupos havia uma linda garota de uns 15 anos, muito bonita, loira, cabelos longos e muito extrovertida, conversava bastante e muito inteligente, mas percebi que ficava muito perto dos meninos, sempre abraçando eles, beijando no rosto, como se precisasse de atenção masculina, mas nessa idade é normal garotas assim, mas havia algo mais que infelizmente fui descobrir de uma forma chocante.
Semanas após no auditório da escola, ao qual reservei, os alunos estavam no palco e eu abaixo no banco para mediar e assistir o debate, como sempre houve um pouco de bagunça, mas também houve varias discussões sobre o assunto, mas infelizmente um dos garotos estava defendendo a legalização do aborto e os problemas de uma criança que não foi aceita pelos pais, quando a garota extrovertida falou de alto e bom som,” como você pode defender isso, você não sabe como é ser molestada pelo próprio pai aos 10 anos de idade, a um homem que deveria protege-la, mas que abusa, eu sei o que é isso, eu senti não própria pele.” Naquele momento todos ficamos boquiabertos, pois nunca imaginaria isso com ela, uma bela garota, bonita, extrovertida e inteligente.
Após um tempo fui conversar com ela, pois fiquei pasmo, mas tinha que tomar uma decisão. Ela me relatou o ocorrido, que agora mora somente com a mãe, mas ainda está traumatizada por tudo que aconteceu. Foi traumatizante para ela, ainda mais contar isso para toda a sala e todos os seus colegas.
O motivo dessa história é contar que milhares de meninas são traumatizadas pelos pais, tios, padrastos e etc. E como um professor pode ajudar nessa situação?

2 - Criança adulta e um teto.

Em uma sala de aula de 1 ano do ensino médio na periferia havia uma aluna que infelizmente era muito mal-educada, que não respeitava os professores, agredia os colegas de sala e tinha grandes dificuldades de aprendizado.
No dia da reunião dos pais, a mãe dela veio conversar e disse que ia conversar com o marido dela sobre a situação, mas o marido não era da mãe, mas sim da garota! Após esse diálogo com a mae, nas próximas aulas tentei me aproximar da garota e saber um pouco mais sobre a vida dela, com o tempo ela me contou e fiquei pasmo com a situação que ela me contou. Ela disse que já tinha um marido desde os 10 anos. Acontece que a mãe e ela foram expulsas de casa pela família, e foram morar na rua, e a mãe acabou conhecendo um homem mais velho que deixou elas dormirem na sala enquanto procuravam um lugar para morar, mas após algumas noites dormindo na casa dele, a mãe dela a convenceu a ela ir dormir com ele no quarto e assim elas teriam alguém para cuidar delas. Pois o homem não tinha interesse na mãe dela, mas sim nela. E assim a partir daquele momento ela se tornou mulher dele desde então, na época o homem tinha uns 50 anos, e ela somente 10. O pessoal do bairro pensa que ele tem um relacionamento com a mãe, mas na realidade, ela é a mulher dele. Após ouvir a história e perguntei por que continua nessa situação depois de tantos anos, ela disse que ele trata muito bem elas e que ela da comida e um teto para morar. E a mãe briga com todos que tentam argumentar que a filha está sendo estuprada.
Mas infelizmente essa garota e a mãe não conseguem perceber o trauma que essa garota passou em plena infância, ela com dificuldades de aprendizado.
E como um professor pode ajudar nessa situação?
Muitos vão argumentar que devemos chamar o conselho tutelar, que devemos encaminhar para psicólogos, que devemos educar nossos alunos para os problemas sociais. Acontece que fazemos isso, mas a realidade e mais complicada do que pensam, as burocracias, as investigações, os processos, torna tudo mais difícil.
Nos que trabalhamos com educação pública somos constantemente travados pela burocracia e a quantidade de problemas sociais, que não são poucos, mas muitos.

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